Uso de cavalo como ‘tela de pintura’ em atividade para crianças é questionado por pedagogos
Em uma colônia de férias na Sociedade Hípica de Brasília, na última semana, crianças foram orientadas a usar canetinhas e tintas para desenhar em um cavalo. A foto do animal (acima), todo colorido, viralizou nas redes sociais e gerou críticas sobre expor um ser vivo a situações de estresse. Como resposta, a hípica afirmou que a atividade tinha “fins pedagógicos”.
Especialistas em educação infantil reforçam que o contato com animais traz, de fato, benefícios à criança. No entanto, explicam que há outras formas de proporcionar essa relação – sem gerar incômodos aos bichos.
“Escolas podem ter coelhos, galinhas e tartarugas, por exemplo. As crianças devem aprender, desde cedo, que os espaços desses animais devem ser respeitados”, conta Fernanda Guidi, pedagoga e professora de um colégio privado de Campinas (SP). “O professor pode aproveitar para falar sobre a alimentação dos bichos, o habitat deles, os meios pelos quais se locomovem”, completa.
Fernanda conta que, ao dar aula para crianças de 0 a 3 anos, também aproveita para ensinar a elas sobre regras e combinados.
“Elas têm de saber até aonde podem ir. Se a escola permitir que elas usem tintas em cavalos, vão achar que podem reproduzir o mesmo comportamento em qualquer outro animal.” – Fernanda Guidi, pedagoga e professora
Medo de animal
A Sociedade Hípica de Brasília afirmou que usa a pintura em cavalos para incentivar que crianças percam o medo dos animais.
Segundo a psicopedagoga Adriana Ferreira, orientadora educacional do Colégio Mopi (RJ), é comum que alguns alunos da educação infantil tenham resistência em entrar em contato com os animais da fazendinha da escola – como coelhos e galinhas.
“Nesse caso, tentamos trabalhar com representações – como miniaturas ou brinquedos. Até que se faça uma transição do lúdico para o real”, diz. “Se, mesmo assim, a criança não quiser tocar nos animais, tentamos uma exposição gradativa a ele. Aos poucos, ela percebe que os colegas passam a mão no coelho e dão comida para as galinhas – e vai se encorajando também”, afirma a psicopedagoga.
Aprendendo com a pintura
Se o objetivo da atividade for incentivar o contato com a pintura, é possível escolher outras plataformas criativas – em vez de expor o cavalo.
“Há milhares de propostas no referencial pedagógico da educação infantil. Podemos usar a tinta lavável para pintar paredes de azulejo, por exemplo. Ou estender um papel craft, do tamanho da mesa do refeitório, e estimular que todas pintem juntas para fazer um mural”, explica Fernanda.
De acordo com a educadora, o desenho e a pintura podem auxiliar no desenvolvimento da coordenação motora e no aprendizado do traçado de números e letras.
“São também uma forma de expressão e de representação do mundo. Pintar junto é interessante por estimular o trabalho em equipe – a criança fortalece suas relações sociais e percebe que cada um tem um estilo e um tempo próprios na atividade”, diz.
Práticas precisam ser revistas
A psicopedagoga Adriana explica que, com o tempo, práticas pedagógicas precisam ser revistas. Mesmo que a hípica não tivesse a intenção de prejudicar o cavalo, necessita repensar a atividade.
“Antes, era comum usar grãos de feijão para ensinar crianças a contar. Hoje, já refletimos sobre o problema da fome e não damos mais esse tipo de função ao alimento. (…) Precisamos sempre refletir sobre o que julgamos como correto.” – Adriana Ferreira, psicopedagoga
Fonte: G1.com.br