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Venda de antidepressivos dispara na pandemia

Redação9 de março de 202115min0
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Enquanto consumo geral de remédios cresceu 11% na pandemia, o de medicamentos para transtornos psíquicos subiu 26%

A maioria dos brasileiros ou teve algum sintoma de depressão e ansiedade durante a pandemia, ou pelo menos conhece alguém que teve. O resultado dos efeitos destes tempos de isolamento e incertezas pode ser visto no aumento do consumo de antidepressivos e ansiolíticos. No ano passado, as vendas de medicamentos genéricos para doenças psíquicas subiram 26%, mais do que o dobro da média de crescimento dos genéricos em geral, que registraram alta de 11% em relação a 2019. Os dados são da IQVIA, auditoria especializada no varejo farmacêutico.

Só na Medley, a venda desse tipo de medicamento subiu 39%, contra uma alta de 19% dos demais genéricos. “Cresceu porque a demanda aumentou e a busca por tratamento também. Todos esses remédios só são vendidos com receita. É um sinal de que as doenças mentais realmente cresceram na pandemia”, explica a gerente de branding da Medley, Fernanda Elias.

A farmacêutica tem outro termômetro para medir o aumento do adoecimento mental durante a pandemia. Desde 2018, a Medley mantém a campanha “Pode contar”, uma plataforma que reúne informações sobre doenças mentais. Em 2020, o total de acessos ultrapassou 2 milhões, 135% a mais que em 2019.

“Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país com o maior número de deprimidos da América Latina, mas só 30% buscam ajuda, porque existe muito preconceito e desinformação. Diante do propósito da Medley de democratizar o acesso à saúde, criamos essa plataforma, para levar conscientizar e levar informação de credibilidade tanto para quem sofre os sintomas como para aqueles que convivem com essas pessoas”, explica Fernanda.

A pedido da reportagem, o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) fez um levantamento sobre a venda dos seguintes compostos: bromazepam, clonazepam, diazepam, lorazepam, flunitrazepam, midazolam e zolpidem. De janeiro a novembro do ano passado, as farmácias de todo o país venderam 17,2% a mais na comparação com o mesmo período de 2019. Em Minas Gerais, o salto foi de 15,7%, na mesma base comparativa. Nesses 11 meses, oito deles na pandemia, só as farmácias mineiras adquiriram 3,71 milhões a mais de caixas desses remédios.

Outro indicativo do maior consumo de antidepressivos e ansiolíticos vem da ePharma, que atua no ramo de convênios entre organizações e farmácias. Apenas em março de 2020, primeiro mês da pandemia, a empresa registrou, na ponta da cadeia, um consumo 4,8% superior ao do mesmo mês de 2019. Em dezembro, a média de consumo estava subindo num ritmo ainda mais acelerado: 13,6%.

Preocupação

Na visão do coordenador da Câmara Técnica de Psiquiatria do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), Paulo Roberto Repsold, a questão é saber como esses medicamentos estão sendo usados. “Há muito abuso por parte da população. Isso é um fato. E, na psiquiatria, predominantemente os remédios tarja preta podem causar dependência”, destaca.

Outro ponto importante, ressalta o especialista, é diferenciar doenças crônicas, como esquizofrenia, transtorno afetivo bipolar, dos transtornos de ansiedade e depressões iniciadas concomitantemente a momentos de maior estresse e perdas, como o enfrentado agora. “É como hipertensão, em que você vai tomar o medicamento a vida toda, e pneumonia, em que o remédio é necessário, mas você toma, sara e pronto, para de tomar”, compara.

Renovar receita tem sido um desafio durante a pandemia

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“É uma bola de neve. Difícil dizer onde começa, e quase nunca tem fim. Às vezes, as coisas vão perdendo o sentido”

Luciano Carvalho, 22

Tem depressão

Sabe quando você está na rua, entretido com alguma coisa, e o barulho ensurdecedor de uma moto desconcerta totalmente seus pensamentos? Assim, o estudante de arquitetura Luciano de Carvalho, 22, tenta explicar a sensação dos primeiros sintomas do transtorno de ansiedade e da depressão, diagnosticados em abril de 2019. Desde então, ele faz uso de medicação. Na pandemia, enquanto o Brasil vê crescer o consumo dos antidepressivos e ansiolíticos, Luciano, assim como muitos outros pacientes, enfrenta dificuldade para renovar receitas.

“Por causa da Covid, o ambulatório fechou. Eu consultei pela última vez em março e deveria ter voltado em junho, mas não era possível marcar. Consegui algumas amostras grátis e pedi a amigos que sei que tinham parado de tomar para me dar o que tinha sobrado. Mas as dosagens deles eram menores”, conta o estudante.

Para o médico que o acompanha, só há agenda para setembro de 2021. O posto de saúde não renova a receita. E o remédio já acabou. “Meu rendimento na faculdade já caiu, porque é difícil concentrar. Parar de uma vez com a medicação deixa uma sensação de estar numa montanha russa, onde só você só desce”, diz.

 

Novo normal camufla diagnósticos de depressão

Em tempos que isolamento, tristeza e ansiedade já fazem parte da rotina, familiares e médicos precisam redobrar a atenção para identificar o adoecimento mental e ajudar

 

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“Para quem está  vivendo isso, eu  diria que vai passar. E, se perceber que  não tá tudo bem, busque ajuda. É importante entender que a depressão não é o fim”

Danielle Avelino, 36, comerciante

A  pandemia de coronavírus trouxe a necessidade de isolamento social e, para muitos, o medo da morte e das incertezas, tristeza e uma série de paranoias. Quadro muito parecido com o apresentado por quem está em depressão. É aí que o diagnóstico de doenças mentais, muitas vezes já embaçado pela correria do dia a dia, fica ainda mais camuflado.

“Sabe que a pandemia traz esse desencadeamento de sintomas ansiosos e depressivos, e o isolamento social é o sintoma mais clássico da depressão. Então como avaliar isso numa época de isolamento?”, reflete o gerente de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte, Fernando Siqueira.

Se para os médicos esse novo normal tem dificultado a descoberta de um quadro depressivo, para os pacientes a situação é ainda mais complicada. É que a tristeza pelas perdas de parentes, emprego, liberdade e vida que tinham antes têm feito com que muitos fiquem tristes com maior frequência.

O psiquiatra Paulo Roberto Repsold, coordenador da Câmara Técnica de Psiquiatria do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), explica que há uma linha que divide o normal do patológico. “Se não consigo me concentrar, discuto muito em família, tenho erros constantes no trabalho, é hora de procurar ajuda médica ou de um psicólogo, pois um encaminha para o outro, conforme a gravidade”, explica.

Para a conselheira e coordenadora da Comissão de Orientação em Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais (CRP-MG), Cristiane Nogueira, é preciso avaliar cada caso com cuidado para que os tratamentos necessários sejam realizados.

Segundo a especialista, para que haja diagnóstico e tratamento adequados, é essencial observar, escutar, aproximar as pessoas de entes queridos e apoio social. “Após filtrar o que é doença daquilo que é sofrimento, temos que sintetizar os primeiros cuidados psicológicos e os aplicá-los. Assim, abriríamos a possibilidade de a sociedade reagir de forma rápida ao problema, pois, quanto mais célere esse retorno, menos sequelas. Nosso tempo de resposta não está bom, do ponto de vista da política pública macro em saúde”, avalia Cristiane.

“Identificar pessoas sensíveis e iniciar um acompanhamento psicológico precoce, assim como envolver a família no processo, faz toda a diferença”, reforça o psiquiatra Paulo Roberto Repsold.

Atenção aos sinais

Foi a mudança de comportamento da mãe que fez Bianca de Souza, 18, perceber que algo estava muito errado. “Ela era uma pessoa feliz, que sempre queria fazer muitas coisas. Até que começou a vir uma tristeza, um desânimo, e mudou tudo. Não era minha mãe. Ela começou a se isolar e, quando a gente queria conversar, ela só chorava. Eu sabia que era coisa séria e que tínhamos que procurar um médico”, conta.

A mãe dela, Danielle Avelino, 36, tomou medicação e fez terapia. Hoje, ela está bem. “Mas, se eu não tivesse me tratado, seria muito difícil enfrentar a pandemia, porque a pessoa deprimida já se sente abafada. Uma coisa é não querer ir a algum lugar, outra é não poder sair porque você não tem escolha”, destaca Danielle.

Para o ajudante de pedreiro Victor Pereira, 20, o isolamento e as abruptas alterações de humor da mãe, Dulcinéia Pereira, 41, acenderam um sinal de alerta. “Tinha dia que ela não suportava nem ver a minha cara. Então eu também me isolava no quarto, porque minha reação era a de não provocar mais tristeza, se sim de tentar ajudar. Então, quando eu via que ela estava mais calma, aí é que eu ia conversar”, conta Victor, que sempre esteve ao lado da mãe. “Família é muito importante. Às vezes a gente não quer conversar, mas precisa de um abraço”, ressalta Dulcinéia.

 

Legenda: Victor está sempre ao lado da mãe, Dulcinéia; para ela, mais do que conversar, o abraço é o mais importante

 

Psicologia tende a ser profissão do futuro

Antes da Covid-19, a depressão já era um transtorno frequente. Agora, esse e outros distúrbios, como ansiedade e pânico, foram amplificados a níveis ainda desconhecidos. Com isso, a tendência é a de que mais pessoas precisem de atendimentos psicológicos em um futuro próximo. “Tempos difíceis nos aguardam, em que o papel do psicólogo na sociedade será preponderante”, afirma o psicólogo, que é presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), Paulo Sardinha.

Membro do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais, Reinaldo da Silva Júnior lembra que não é de hoje que a psicologia é vista como a profissão do futuro. “Vários indicadores já apontavam os problemas mentais como um grupo de patologias crescentes. Esse momento nos mostra um novo aporte na psicologia, mas estamos no olho do furacão. Não sabemos se a demanda permanecerá tão alta”, diz. Segundo ele, independentemente de ser momentânea, é grande a procura, tanto por indicação de profissionais como de vestibulandos pelo curso.

Teatro pode ser porta de entrada para reinserção

Para a imensa maioria da população, o isolamento social foi uma novidade trazida pela pandemia. Mas, para os portadores de sofrimento mental, estar isolado não é algo novo. Vítimas de estigma, os usuários da rede de saúde mental acumulam uma camada complementar de preconceito.

“Eles me falaram que, de alguma maneira, já estavam isolados há algum tempo”, observa Juliana Barreto. A atriz é testemunha íntima desse cotidiano, pois coordena o Sapos e Afogados. Com sede própria no bairro Lagoinha, o grupo de artes cênicas foi criado por ela em 2002 e reúne 16 integrantes, todos portadores de sofrimentos mentais. “Eles ficaram ansiosos no primeiro momento, mas em seguida fizemos apresentações virtuais”, diz Juliana.

Nesse caminho de combate aos estereótipos, o grupo trabalha para argumentar contra o senso comum quando o assunto é transtorno mental e ainda promove a reinserção psicossocial dos integrantes.capitulo02-01

Fonte: O Tempo

Redação


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