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Telefonia é alvo de três queixas por minuto no país

Redação16 de janeiro de 202313min0
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Gigantes do setor, como Claro, Vivo, Tim e Algar, abusam do consumidor com serviços de má qualidade, erros em cobranças, conexão e cobertura ruins e insistência de telemarketing

“A Claro me liga todos os dias, sem exceção, inclusive no sábado e domingo, desde que fechei o pacote da internet aqui de casa. Já bloqueei o número, tentaram ligar de outro e continuam incomodando. Não adianta: posso bloquear, arrumo outro telefone e é sempre assim. Já estou até acostumada a apertar o botãozinho de desligar”, diz uma consumidora à reportagem. “Fiz portabilidade de três fixos da minha empresa da Vivo para a Algar. As contas da Vivo teriam que vir proporcionais ao uso do mês, mas só uma veio assim e as outras duas, integrais. Entrei em contato, falaram que analisariam e retornariam em cinco dias. Não tive retorno nenhum, liguei de novo e tenho mais de dez protocolos de atendimento. Veio a segunda fatura, a mesma coisa. Veio a terceira fatura, a mesma coisa. Até que cancelaram a linha, por eu não ter pago, e recebi uma carta falando que meu nome estava negativado. Foram R$ 536,28”, relata outra.

O fio de problemas não acaba: “Estou há meses precisando relatar as reclamações da empresa (Tim), pois todos os meses me mandam o boleto com o valor a mais do plano. Tento falar com eles via WhatsApp ou ligações, mas não resolvem. Já sabem que o valor do meu plano empresarial vem errado todo mês e, mesmo assim, eu preciso vir até este [site] para abrir a reclamação para que, assim, entrem em contato comigo e me mandem o boleto no valor correto”, escreve um terceiro cliente, no “Reclame Aqui”. “A Net/Claro começou a cobrar um pacote de jogos de futebol dos meus pais, sendo que isso nunca foi assinado, porque meu pai jamais assinaria isso. Não mudamos o plano de TV, só pedimos para tirar esse pacote. Eu acho que deveríamos entrar com um processo, porque obviamente as empresas estão fazendo isso com muita gente e ganhando muita grana com isso. Cobraram R$ 29,90 mensais a mais desde setembro do ano passado. Cada fatura vem com um valor diferente, tiram e colocam valores e não dá para entender o porquê”, narra outra consumidora ouvida pela reportagem, que reclama que o serviço caro das teles não condizem com a qualidade do serviço oferecido.

Estas são algumas das milhões de reclamações sobre as empresas de telecomunicações ao longo das últimas décadas, e situações desse tipo continuam sendo registradas ano após ano. Só em 2022, foram cerca de 1,4 milhão de queixas contra empresas  protocoladas na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) — quase três por minuto ao longo do ano. Isso sem contar as reivindicações registradas nos Procons estaduais. Em Minas Gerais, por exemplo, desde 2015, o Procon do Ministério Público (MPMG) e o Procon da Assembleia (ALMG) receberam 203 mil reclamações. Na Justiça, consumidores ganham ações de milhares de reais após abusos, enganos e descuidos das empresas serem comprovados e, do outro lado do negócio, trabalhadores que atuam no telemarketing das operadoras denunciam que até o tempo para usarem o banheiro é controlado no dia a dia. Na mira da fiscalização, as empresas foram multadas em bilhões de reais na última década, mas conseguiram escapar sem pagar nem 7% do valor dos processos da Anatel.

São problemas que se avolumam há décadas e velhos conhecidos de quem trabalha com direito do consumidor. Para analistas, eles continuam se repetindo devido ao volume da demanda pelo serviço, cada dia maior, e ao poderio das empresas, que valem milhões no mercado. Existem mais acessos à telefonia móvel, por exemplo, do que habitantes no Brasil: os dados mais recentes da Anatel, de novembro de 2022, contabilizam quase 255 milhões de acessos.

O principal motivo de reclamações na Anatel sobre as empresas de telecomunicações são as cobranças indevidas. Em 2022, foram 608,1 mil queixas sobre esse problema, o equivalente a quase 34% do total. A advogada Cristiane Araujo atesta que eles são os mais comuns no dia a dia do escritório. “São reclamações sobre a cobrança de valores não contratados e a dificuldade em excluir esses valores do pagamento, o que culmina no bloqueio das contas pela contestação e no não pagamento, o que pode deixar o nome do consumidor negativado. São casos em que a pessoa contratou com um determinado valor de plano, mas a empresa cobra mais e diz que aumentou os megas de internet, porém isso não foi solicitado pelo consumidor, por exemplo. Uma prática muito comum é fazer pequenas alterações no pacote contratado e cobrar mais”, diz.

Uma das pessoas que aparecem reclamando no início desta reportagem é a empresária Marina Faria da Silveira, 40. Mesmo após concluir a portabilidade da Vivo para a Algar, ela continuou a ser cobrada pela primeira durante três meses e seu nome foi negativado. “Estou entrando na Justiça antes que esse nome negativo leve a algum transtorno. Acho que é má fé e mau serviço da empresa, porque era só ela verificar que a portabilidade foi feita. Eu ligava para eles e sempre tinha que esperar muito, a pessoa que atendia transferia para outro setor, às vezes a ligação caía ou falavam que iriam retornar e não retornavam”, detalha.

Essa é apenas uma das dezenas de milhares de situações que os consumidores enfrentam rotineiramente com as empresas de telecomunicações. Além de 608,1 mil reclamações sobre cobrança indevida só em 2022, a Anatel recebeu 796,4 mil reclamações sobre má qualidade, cancelamento de serviço e dificuldades com planos e promoções, por exemplo.

Internet e comunicação são serviços essenciais e cada reclamação importa, diz Idec

Marco Civil da Internet define que o acesso à rede é “essencial ao exercício da cidadania”. Na prática, hoje os brasileiros estão nas mãos de empresas milionárias e os direitos de milhões de pessoas a internet e a outros serviços de comunicação são prejudicados devido a erros ou más práticas dessas instituições. “O fornecimento desse serviço com acesso e qualidade é essencial para vários direitos. Nós trabalhamos com a internet e nos informamos por ela. Não é mais um supérfluo”, pontua advogada e pesquisadora do programa de Telecomunicações do Idec Camila Contri Leite.

A Anatel, por outro lado, destaca que, ainda que o número de reclamações passe da casa do milhão, ele vem diminuindo ao longo dos anos. “Em 2015, tínhamos aproximadamente 4 milhões de reclamações na Anatel. Em 2016, 2017, passamos a carregar mais inteligência no trabalho de fiscalização e a priorizar os temas mais importantes, mais reclamados. O objetivo é solucionar problemas, porque não adianta multar se eles persistirem e o consumidor continuar sofrendo com eles”, diz o gerente de Tratamento de Solicitações da Anatel, Augusto Katagiri.

Mesmo em queda e relativamente pequenos em comparação às centenas de milhões de usuários das telecomunicações, especialmente da internet, os números atuais são preocupantes, já que afetam um serviço essencial, destaca Contri Leite, do Idec. “As reclamações podem ser pouco significativas proporcionalmente, mas o número bruto ainda é alarmante para um serviço básico. É essencial que a qualidade dele melhore. Sozinhas, as maiores empresas já têm muito controle e conjuntamente têm ainda mais poder de barganha com as autoridades. A Anatel tem se atentado a essas questões, mas é necessário fazer mais”, finaliza. Uma das alternativas para minimizar prejuízos, implantada pela Anatel, é determinar que as empresas invistam em infraestrutura onde não terão lucro, mas atenderão à sociedade, em vez de pagarem multas (confira mais na página ao lado).

Abusos também estão dentro das empresas

Do outro lado da linha das milhares de ligações das teles que incomodam os consumidores brasileiros diariamente, por vezes estão trabalhadores em situações deploráveis de trabalho. “Descobrimos que há supervisores que fazem os vendedores realizarem vendas indevidas para bater metas e sistemas que conseguem registrar vendas que o cliente não quer”, exemplifica a diretora de pesquisa e tecnologia do Sinttel-MG, Rafaela Andrade.

Além das ações que impactam diretamente o consumidor, ela também descreve um cenário de abuso diário: “Tem supervisor que coloca a mesa na frente da porta do banheiro para controlar o tempo do trabalhador lá dentro. A gente sempre aciona o Ministério do Trabalho, mas as empresas ficam sabendo e, quando o governo chega lá, está tudo bonito, parecem o melhor do país para trabalhar”, conclui.

Resposta das operadoras

A reportagem entrou em contato com as operadoras e foi atendida pela Conexis, associação que representa as principais prestadoras de telecomunicações (Algar, Claro, Oi, VIVO, TIM e Sercomtel). Confira a nota da associação na íntegra:

“O setor de telecomunicações tem mais de 340 milhões de acessos entre celulares, banda larga fixa, telefone fixo e TV por assinatura. Mesmo com o aumento da demanda, que se intensificou a partir de 2020 com a pandemia da Covid-19, as reclamações de usuários de serviços de telecomunicações registradas na Anatel têm apresentado sucessivas quedas, com reduções de mais de 15%, desde abril de 2021.

Em novembro do ano passado o número de reclamações caiu 29% em relação a novembro de 2021. As reduções nas reclamações também são verificadas em outras plataformas, como a Consumidor.gov.

Os resultados refletem diversas ações do setor, entre elas a ampliação de seus canais digitais, e a criação do canal da Ouvidoria, para melhor atender seus milhões de clientes e manter em alta a resolutividade de todas as demandas”.

Fonte: O Tempo

Redação


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