Queijo Minas Artesanal: produtores comemoram conquistas do produto, marginalizado durante anos
No dia do Queijo Minas Artesanal (QMA), o diretor de Agro-Indústria e Cooperativismo da Secretaria de Estado da Agricultura e Pecuária (Seapa), Ranier Chaves Figueiredo, lembra que os produtores da iguaria têm muito o que comemorar. O produto que, durante anos, foi marginalizado por seu modo de fazer artesanal, por utilizar leite cru e não ter regulamentação específica é, hoje, reconhecido nas instâncias federal, estadual e municipal por sua importância econômica, gastronômica e cultural. “Já temos um arcabouço legal implantado que obriga o poder público a proteger, valorizar e promover esse alimento tão importante para os mineiros e brasileiros em geral”, disse.
Ranier conversou com a Itatiaia sobre as principais conquistas dos produtores de Queijo Minas Artesanal e sobre o que ainda falta conquistar. Confira:
O que se conquistou:
Protagonismo – Os produtores de queijo evoluíram. Estão mais bem informados e têm se habilitado, cada vez mais, para cumprir a legislação e acessar mercados formais, colocar seus queijos em grandes redes consumidoras, extrapolando as fronteiras dos municípios e do estado. “Antes, isso não era permitido. Uma legislação atrasada e inadequada ao segmento artesanal impediu, durante anos, o desenvolvimento dos nossos queijos”.
Valor agregado – Os QMAs, hoje, são vendidos por valores justos, levando-se em consideração a quantidade de leite que se gasta (aproximadamente 10 litros para 1 kg de queijo) o tempo de produção e o saber histórico.
Legislação mais adequada – Em meados dos anos 90, houve um movimento de inspeção, de fiscalização e de cerceamento da comercialização e da produção de queijos artesanais feitos com leite cru, por parte dos órgãos oficiais. Nesse momento complicado na história dos queijos artesanais, Minas reagiu, em 2002, aprovando uma lei estadual, para fomentar e permitir a produção e comercialização desses queijos”. Minas enfrentou as legislações federais, impulsionando um movimento de resgate que, em pouco tempo, se alastrou pelo país.
Redução do tempo de maturação – Uma conquista recente, muito demandada pelo setor nas regiões das Serras do Salitre e da Canastra onde era exigido um período mínimo de 22 dias de maturação, nos conseguimos reduzir para quatorze dias de maturação com base em pesquisas científicas realizadas na Universidade Federal de Minas Gerais
Selo-Arte – Um grande avanço na legislação dos artesanais em âmbito federal foi a publicação da legislação que implementou que criou o selo Arte, uma lei federal de 2018 que permite que o produto, reconhecidamente artesanal, pode ser comercializado em todo território nacional independentemente de qual serviço de inspeção que habilita esse produto. “Esse foi um avanço importantíssimo, impulsionado esse ano de 2023, a partir da publicação do decreto 1199 que permite que os municípios também possam emitir o Selo-Arte”.
Modo de fazer veio da Ilha dos Açores
Pouca gente sabe como se deu a implementação da arte de se fazer queijo no Estado. Durante a colonização no século XVII e XVIII, houve um grande boom populacional com a chegada de muitos estrangeiros – especialmente portugueses – que vieram pra cá em busca do ouro. Só que isso gerou um problema: a escassez de alimentos. Não havia mão de obra capaz de produzir uma quantidade de alimentos suficiente para o tamanho daquela população.
Foi nesse contexto que os QMAs ganharam importância. Os portugueses trouxeram o modo de fazer queijo, utilizando-se o soro do leite o Pingo, fermento natural. Essa tecnologia de transformar o leite em queijo, artesanalmente, foi providencial por sua maior perenidade/durabilidade, facilidade de transporte e etc. O queijo caiu no gosto da população, consolidando-se no cenário produtivo do Estado.
Nem tudo foram flores
Na década de 50, o Brasil se urbanizava e precisava se industrializar para alimentar as pessoas dos grandes centros urbanos que se formavam. Foi nessa época que surgiram as primeiras legislações sobre as habilitações sanitárias para estabelecimentos de produtos de origem animal no país, com foco no universo industrial.
Em 96, nova legislação, igualmente inadequada
Em 1996, a publicação de um Regulamento Técnico pelo Governo Federal instituiu padrões de identidade e qualidade para queijos. E, mais uma vez, os produtos artesanais foram esquecidos. “Só que dessa vez, além de esquecer e marginalizar os produtos artesanais, essa lei ‘atacou’ esses produtos estabelecendo um período de maturação prolongado demais. Ficou proibida a comercialização de queijos leite cru que não fossem maturados por, no mínimo, 60 dias. “Esse tempo de maturação segue um padrão europeu e norte-americano para queijos maturados em climas temperados, o que é completamente diferente da nossa realidade”, disse Ranier.
Fonte: Itatiaia