Falar sobre sentimentos é chave para diálogo real
Agosto é mês de volta às aulas. Para muitas mulheres é um mês de sentimentos opostos. Um lado sente um alívio imenso de sobrar um tempo para si, outro lado sente um certo aperto por permitir-se sentir a liberdade entrar no peito. Acho que muitos homens não passam pelo mesmo conflito.
Eu, no primeiro momento que consegui ter, exato último dia das férias, tranquei-me em meu mundo e devorei um livro intrigante: A Pediatra, da Andréa del Fuego*. Ainda não sei se gostei ou não, mas foi um livro que terminei de ler em menos de 10 horas. Algumas podem me questionar onde está o intrigante nele, outras podem deixar o livro e resumir o sentimento em raiva, desespero, indignação, mas acho difícil alguém fechar a última página com um sentimento único e positivo.
Como lidar com as feridas da infância e a autocrítica?
Não dividindo os detalhes, o livro me trouxe recordações de um momento em que eu só respirava. Na primeira gravidez tivemos gêmeas.
Memórias
Eu costumo dizer que ter trigêmeos ou mais é que é difícil, gêmeos é intenso. Um colo, uma mama (duas simultâneas só quem pode mesmo…), um cérebro, um tempo, dividir a vida é uma matemática complicada na vida real de uma mãe de gêmeos. Intensidade é a palavra.
Nesse cenário, conhecemos alguns pediatras. O primeiro, maravilhoso, porém ficou longe de onde fomos morar. A segunda, ao lado de casa e mais naturalista que o primeiro, porém entediada com a própria vida. O terceiro, ficamos por muito tempo até decidirmos adotar um método menos alopático, e o quarto um achado na vida – até hoje sentimos falta de sua atenção e humanidade. 4 pediatras em 4 anos de filhos, e quando encontramos nossa pérola negra tivemos que mudar da País.
Voltando ao livro, acho que ficou evidente qual dos 4 pediatras o livro me fez recordar ao longo do desmembramento da história de Cecília, a pediatra que Andréa conta. Cecília é uma mulher pediatra e o exercício de sua profissão é o espelho de suas cicatrizes. Ela trava desafios com seu passado e vai descobrindo a luz dentro de seus incômodos no desenrolar das páginas.
Lembranças
Em paralelo, esse livro me fez recordar um show que consegui ir com meu marido (celebre sempre as pequenas vitórias!). Há uns anos, fomos ao show do Whindersson Nunes. Sem spoiler, ele conta uma passagem na vida dele que resume o motivo que o levou a fazer comédia.
Ele conta que na sua infância havia muitas discussões no café-da-manhã. Que seus pais e diversos irmãos reagiam de formas diferentes às reclamações e divergências da família. E ele sempre ao ver a confusão reagia com piada e palhaçada.
Whindersson batizou esses momentos obscuros e transformadores da vida como nosso “Coringa”. No caso dele, ele encontrou na comédia uma fórmula de escape de situações de conflito.
Onde encontramos desafios
Foi muito legal vê-lo falando de um assunto tão importante e que já escrevi por aqui e em minha newsletter no Substack. O que ele chama de Coringa, eu chamo de Momento Emocional, seu Ponto de Inflexão (M.E.P.I.).
Esse Momento, cria um ponto de inflexão na vida e acaba determinando a base de um hábito – hábito nada mais é do que um comportamento repetido e alimentado por muito tempo que até acaba parecendo parte de você, mas não é!
Em outras palavras, um hábito é algo que você escolhe repetir (com ou sem intenção) em situações completamente diferentes, porém com o mesmo comportamento. Algo que você faz sempre em que ocorre algo – como um gatilho para o comportamento aparecer.
Onde encontramos soluções
Se olhar agora para trás na sua vida, você é capaz de lembrar de um fato da sua primeira memória que remete aos mesmos momentos em que você hoje se sente irritada ou irritado, com medo de falhar, com pensamentos avoados e reagindo com evasão e irritação – o mesmo ocorre com os sentimentos mais alegres e que trazem satisfação.
Você pode se deparar com um fato aparentemente simples comparado à vida que você tem hoje.
Pode ser um dia em que seus pais ou algum adulto cuidador não deu atenção aos seus sentimentos, que você não sentiu as manifestações de suas emoções validadas, e possivelmente diminuíram a sua importância colocando outros fatos acima da sua necessidade. Você querendo uma brincadeira nova, não querendo tomar banho, ou fazendo o seu primeiro dever de casa.
Para a Felicidade
Cecília, nossa protagonista em A Pediatra, deixa gritantemente evidente esse Coringa e a pergunta que eu, leitora, fazia o tempo todo era: Por que?!!! Por que continuar se martirizando e prejudicando a própria vida e a vida de outras pessoas?! Que agonia…
Em A Porta da Felicidade eu escrevi: Divida seus sentimentos com seus filhos, com seu parceiro(a) e com sua família. CONSTANTEMENTE, nomeie aquilo que você está sentindo, verbalize-se! Esse será seu principal legado.
Mas só falar isso não ajuda muito. Sentimentos não se traduzem com uma simples palavra. Além disso, para cada um, as palavras se apresentam como memória, que às vezes podem vir acompanhadas com lembranças como sons, cheiros ou imagens.
Sempre o Diálogo
Então, você realmente precisa dialogar. Dialogar consigo mesma e dialogar com o outro. Dialogar com presença, com atenção. Até dialogar em silêncio (leia As virtudes do Silêncio).
Para te auxiliar nesse caminhar, quero te fazer 3 indicações bem especiais:
Para ler: Nancy Kline é professora, pesquisadora, autora de dezenas de livros*, co-fundadora da Thornton Friends School em Maryland e diretora da empresa de liderança e coaching Time to Think. Infelizmente não encontrei uma edição em Português de seus livros, quem souber pode deixar a dica nos comentários?
Em seu livro, Time to Think*, ela comenta que nossas ações dependem do pensamento que as precede. Além disso, nosso pensamento depende de quão bem os outros nos ouvem. Ela realizou uma pesquisa em seus alunos a qual mostrou que, embora fatores como idade, QI e experiência tivessem pouco impacto sobre o raciocínio dos alunos, a atenção que os outros prestavam a eles tinha um impacto significativo.
Para assistir: Como cuidar de um bebê elefante (“Elephant Whisperers”), é documentário dirigido por Kartiki Gonsalves que explora a relação entre os humanos e elefantes. O filme segue o casal indiano Bonman e Belli, que cuidam de dois filhotes órfãos, Raghu e Ammu. O filme mostra o forte vínculo que os cuidadores desenvolvem com os elefantes e como os animais têm um impacto positivo na vida dos humanos.
Além de discutir a importância da conservação dos animais e como os santuários são essenciais para a preservação das espécies, o filme é uma reflexão profunda sobre a parentalidade e o meio ambiente, sobre as escolhas que os pais fazem para criar seus filhos, o papel da família e da comunidade, e sobre a importância do diálogo para entender diferentes perspectivas.