Teve zika? Com restrição de testes, cenário da doença pode estar camuflado em MG
Os sintomas são muito parecidos: febre, dor no corpo e na cabeça, cansaço. A vermelhidão na pele, que começa na região da barriga e vai se expandindo para os braços e pernas, é o que pode indicar um diagnóstico diferente. Em meio à alta de casos de arboviroses em Minas Gerais, a testagem para a dengue e a chikungunya é realizada simultaneamente, mas, sobra uma: e a zika?
Na rede privada, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), a testagem para a zika só é obrigatória para gestantes e bebês em risco de infecção ou nascidos com microcefalia. O mesmo se repete na rede SUS-MG: apesar dos exames de dengue e chikungunya serem realizados simultaneamente, a testagem para zika fica restrita a grávidas, recém-nascidos e viajantes que vêm de áreas com circulação da doença.
Quando se pensa que, nas farmácias – se houver estoque –, a testagem para zika tem um preço médio de R$150 e que é mais fácil encontrar kits de testes por até R$ 1.000, o diagnóstico acaba sendo dispensado. Entre os que fazem consultas e tratam a doença sem a confirmação da infecção, apenas com o negativo da dengue, estão principalmente os usuários de planos de saúde – 27% dos mineiros – e os pacientes de hospitais de gestão do Estado que não se encaixam no grupo de risco.
O problema dessa restrição na testagem para a zika é a possível camuflagem no cenário da doença no Estado, segundo o infectologista Leandro Curi. “Não é raro que o paciente faça o teste de dengue, dê negativo, faça até de covid, e dê negativo. Esse ‘diagnóstico de nada’, pode ser sim uma zika silenciosa. Quando essa testagem para a doença não está sendo feita, corre-se o risco de estarmos tendo um maior número de casos do que está sendo noticiado”, alerta.
Em Minas Gerais, segundo o balanço da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), há cinco casos de zika confirmados e outros 67 ainda em investigação. Nenhuma morte foi registrada para a doença em 2024. Mas, o problema da restrição dos testes ao grupo de risco é que os dados podem, então, estar subnotificados. “Se ninguém pensa em zika, se ninguém notifica a doença, podemos perder a real noção da situação de casos. Se não tem testagem, não tem diagnósticos, acaba em subnotificação”, afirma.
Transmissão fora dos registros
O Governo de Minas afirma que, para todos os casos confirmados de zika, os municípios são instruídos a fazerem uma avaliação “bastante criteriosa”. O Estado afirma que, após essa investigação, alguns casos acabam sendo reclassificados. Ainda, é feita uma vigilância amostral da zika por amostras enviadas por serviços de saúde de Minas. Essa vigilância não foi detalhada pelo Estado.
O risco com relação à zika, de acordo com o infectologista Leandro Curi, é que a doença cresça em Minas Gerais da mesma forma que aconteceu com a chikungunya nos últimos anos. “São números que precisam ser acompanhados porque, dentro de uma epidemia de dengue e alta de arboviroses, o vírus pode crescer em Minas. Se a forma de transmissão é a mesma e o ambiente é favorável, estamos sujeitos a viver o que aconteceu com a chikungunya, que veio de outros Estados e pegou a população vulnerável”, descreve.
O especialista reforça que, dentro do monitoramento epidemiológico das doenças, o controle de casos indica onde e como as ações de enfrentamento precisam ser empenhadas. “Mesmo que os casos sejam brandos, se eu não sei onde está a maior incidência de zika, como que vou conseguir decidir as cidades potenciais para o grupo de risco e as ações de prevenção?”, questiona.
Dengue ou zika?
De acordo com Curi, a zika é uma “versão mais branda” da dengue. Seus sintomas também incluem febre, dor no corpo e na cabeça e cansaço, mas com intensidades menores. No caso da zika, as manchas vermelhas chamam mais atenção, principalmente na região da barriga, e não há, necessariamente, a queda no número de plaquetas no corpo.
A mortalidade no caso de pessoas infectadas com zika também é menor do que na dengue, mas, em gestantes, o cuidado deve ser maior pelo risco de malformações no bebê. É por isso que o grupo foi escolhido para a obtenção de testagem para a doença. “Nós aprendemos de modo triste, em 2015-2016, que a zika causa microcefalia, problemas sérios no bebê. O diagnóstico adequado precisa ser acompanhado o quanto antes nesses casos”, alerta o infectologista.
Não há medicação direta ou vacinação para a zika, o tratamento, assim como para as demais arboviroses, é por meio de hidratação e medicamentos de redução dos sintomas.
Fonte: O Tempo