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Desconectar para conectar. Como o celular e as redes sociais nos roubam da vida real?

Redação11 de março de 20259min0
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Excesso de telas atrapalha desenvolvimento cerebral e capacidade de lidar com sentimentos, segundo especialista

As gravações de “Ainda Estou Aqui”, vencedor do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2025, têm uma curiosidade: todos os atores e demais membros da equipe foram proibidos de usar o celular no set de filmagem. A motivação foi o objetivo de manter a concentração e o espírito da época retratada no filme, na década de 1970. No cinema, a estratégia não é tão incomum. Quentin Tarantino baniu os smartphones de “Era Uma Vez em… Hollywood”, e Denis Villeneuve fez o mesmo durante as filmagens de “Duna”. Mas essa tática vai muito além do cinema.

O que se percebe atualmente é que, para diversas situações, é necessário se desconectar da internet para se concentrar nas questões do dia a dia. Vivemos em uma era em que as pessoas almoçam com seus celulares, passam mais tempo nos telefones do que interagindo com suas famílias e acabam perdendo tempo durante o expediente com aplicativos ou simplesmente rolando um feed infinito cheio de vídeos curtos e memes sobre a própria vida moderna. Pouco se sabe sobre o que está acontecendo ao redor.

Segundo Matheus Beato, psicólogo e neuropsicólogo, a internet e o uso excessivo das mídias sociais estão nos levando a essa desconexão. Segundo ele, as redes sociais simulam uma conexão – que é a interação social –, porém ela é baseada em recortes. “A internet traz muitas informações do mundo real, mas é uma simulação, algum recorte, não é de fato a experiência que a gente vê no mundo real. A psicomotricidade se desenvolve na ação. A neuroplasticidade – que é a capacidade do cérebro de se modificar e se adaptar a novas experiências – também precisa da ação do mundo real, do mundo concreto, e não apenas da simulação por meio das redes”, explica.

O especialista analisa que, nessas plataformas, escolhemos nossas simulações de forma a sentir bem-estar, o que pode levar à dependência digital. “Estou controlando o que quero expor, o que quero falar, o que quero pesquisar, então, obviamente, vou buscar aquilo que me dá prazer, que me dá fontes dopaminérgicas rápidas. Só que a vida real não é assim. Na vida real também tem desconforto, tem aspectos que vão nos deixar tristes. Se eu não desenvolver isso, chego ao mundo real e tenho dificuldade de lidar com emoções tristes, de ser vulnerável, de ser frustrado”, afirma.

Off-line no trabalho

E não são só os cineastas que buscam impedir essa desconexão com a realidade causada pelos smartphones. Muitas empresas proíbem o uso dos celulares no ambiente de trabalho por questões de segurança, produtividade ou proteção de informações confidenciais. No quesito concentração, os bons resultados da limitação são enumerados por Beato.

“Voltamos a ser mais atentos, ou seja, a ter mais concentração e foco nas nossas atividades. Porque o telefone, hoje, tem inúmeros estímulos que concorrem pela nossa atenção. Se eu tenho muitos estímulos concorrendo ao mesmo tempo, eu tenho dificuldade de me concentrar. Aí, a minha atenção fica mais dividida ou alternada. Tendo uma atenção (sem o celular), consigo trabalhar uma memória operacional um pouco melhor. Consequentemente, consigo produzir mais”, avalia Beato.

Mundo paralelo

E não é só na labuta que os benefícios são percebidos. O afastamento das redes sociais proporciona ganhos na autoestima, na autoconfiança, na melhoria do sono e no bem-estar mental geral, com evidente queda na ansiedade. Para as crianças, os ganhos são ainda maiores, visto que elas estão no ápice da neuroplasticidade. Nesse sentido, já está em vigor a Lei 15.100/2025, que restringe o uso de celulares nas escolas.

Para a psicóloga e psicopedagoga Roneida Gontijo, a legislação é um passo positivo, uma vez que a presença das telas distrai o aluno, reduzindo o foco e comprometendo o desempenho pedagógico. “Além das dificuldades acadêmicas, o uso excessivo de dispositivos na escola também impacta a socialização, afastando as crianças dos colegas e criando um isolamento. Muitos acabam vivendo em um ‘mundo paralelo’, desconectados da interação real. Ao limitar as telas, a escola fortalece a concentração, melhora o rendimento escolar e estimula relações sociais saudáveis, essenciais para o desenvolvimento emocional e cognitivo dos alunos”, afirma.

Para além dos muros da escola, a psicopedagoga orienta que, em casa, os pais também estabeleçam limites saudáveis e incentivem atividades fora do digital, visto que o uso prolongado de telas pode afetar o vínculo afetivo e a construção de habilidades sociais importantes.

“Momentos de interação real, como brincadeiras e conversas, são essenciais para um desenvolvimento equilibrado e relações familiares mais fortes. Acredito muito na instituição família, e sei que pequenos ajustes, podem trazer grandes resultados. Mensagem para os pais: nunca desistam dos seus filhos. Cada movimento valerá a pena”, alerta Roneida.

Empresas podem proibir?

Mas o que diz a lei? Existiria algum abuso em proibir o uso de um aparelho que está tão disseminado na nossa rotina? O advogado trabalhista Ítalo Moreira Reis esclarece que o empregador tem alguns poderes relacionados à sua atividade empresarial. Um desses poderes é o de regulamentar. Significa que ele pode criar um regulamento interno com regras e normas de conduta para o bom andamento da atuação profissional.

“Ele pode proibir a utilização de celulares e de redes sociais durante o horário de trabalho independentemente se a atividade é de risco ou não. Claro que, para algumas atividades, isso se justifica ainda mais, quando envolve uma questão de segurança da atividade e dos próprios empregados. Mas, mesmo que não se tenha essa questão, ele pode proibir e determinar que o empregado não se disperse”, destaca.

Mas, segundo o advogado, o patrão não pode cometer abusos. Durante o intervalo de almoço, por exemplo, o empregado não está à disposição do empregador. “Ele não recebe por aquele tempo. Então, ele poderia, naquele período, utilizar o seu celular. Caso o empregador crie uma norma proibindo o uso no intervalo intrajornada, seria uma norma abusiva, já que o empregador não está pagando por aquele horário”, explica Reis.

As empresas também não podem proibir o empregado de fazer uso do telefone em caso de uma necessidade. “É uma questão de razoabilidade. Ele não poderia, em nenhuma hipótese, diante de situações excepcionais, proibir o uso do celular por uma mãe que está com um filho doente, por exemplo, ou um filho que precisa de entrar em contato com a mãe por alguma necessidade… Não seria razoável. Diante de uma necessidade real do empregado para a utilização, uma eventual proibição poderia acarretar ali um abuso de direito. Muito embora ele possa criar, ele não pode abusar desse direito”, ressalta o especialista.

Fonte: O Tempo

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