Covid envelhece artérias, mesmo em pacientes que tiveram quadro leve
Mesmo após a recuperação clínica, a Covid-19 pode deixar marcas no sistema cardiovascular. Essa é a conclusão do maior estudo populacional com sobreviventes da doença, realizado com mais de 2 mil pessoas em 16 países, incluindo o Brasil. O trabalho mostrou que todos os participantes que foram infectados pelo vírus apresentaram maior rigidez nas grandes artérias em comparação com aqueles que não foram infectados.
De acordo com o estudo, publicado no European Heart Journal, a infecção por Covid-19 pode acelerar o envelhecimento vascular, com efeitos mais pronunciados em mulheres, especialmente aquelas com sintomas persistentes, independente da gravidade da doença.
Segundo a Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, foram notificados em 2025, até 28 de setembro, 311.849 casos de Covid-19 no Brasil.
A investigação, realizada pelo consórcio Cartesian – que juntou esforços de integrantes de 34 centros de pesquisa em todo o mundo –, é a primeira a avaliar os efeitos de longo prazo da Covid-19 na rigidez arterial, um indicador do envelhecimento vascular que pode aumentar o risco de desenvolver insuficiência cardíaca, infarto, acidente vascular cerebral e outras complicações cardiovasculares.
“O estudo mostrou que pessoas que tiveram Covid-19 apresentam maior rigidez das grandes artérias, o que pode indicar envelhecimento vascular e comprometer o fluxo de sangue para o cérebro e outros órgãos”, diz Emmanuel Ciolac, professor da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Bauru – uma das instituições que participaram do consórcio.
“Esse efeito foi independente da gravidade da doença ou de fatores como hipertensão, embora estudos com outras populações demonstrem que a pressão alta contribua em parte para esse quadro”.
A investigação realizada foi apoiada pela Fapesp.
A boa notícia, destaca o pesquisador da Unesp, é que a rigidez arterial tende a diminuir com o tempo, conforme observado entre os participantes do estudo após um ano da infecção. “Isso ressalta a importância de programas de reabilitação envolvendo atividade física, por exemplo. São situações, na maioria dos casos, que podem ser reversíveis e, cada vez mais, vemos que é preciso uma atenção de longo prazo nos infectados pela Covid-19”, diz o pesquisador que em uma outra investigação, com um grupo pequeno de participantes e desvinculado do consórcio Cartesian, comprovou os efeitos da prática de exercício físico na reversão da rigidez arterial.
Trabalho em equipe
No trabalho, os pesquisadores analisaram a saúde vascular de 2.390 pessoas por meio de um exame não invasivo (velocidade da onda de pulso carótida-femoral), que avalia de forma eficiente a rigidez das grandes artérias. Participaram do estudo pessoas infectadas pelo coronavírus entre 2020 e 2022, com diferentes níveis de gravidade: desde pessoas que não foram infectadas; casos leves, que não exigiram internação; até pacientes hospitalizados e tratados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). O grupo incluía tanto vacinados quanto não vacinados.
Com o envelhecimento, é comum que o tecido elástico das artérias seja substituído por um mais fibroso, tornando-as mais rígidas e dificultando a irrigação de órgãos vitais como o cérebro, coração e fígado. “No entanto, identificamos no estudo que, após seis meses de infecção, os participantes apresentavam uma maior rigidez das artérias em comparação com aqueles que não tiveram Covid-19. Houve um envelhecimento acelerado das artérias entre todos os participantes infectados”, afirma.
Outro achado importante foi que os participantes que tinham sido vacinados apresentaram uma menor rigidez em comparação com os não vacinados.
“O estudo reforça a importância de acompanhar a saúde cardiovascular de quem teve Covid-19, mesmo após a recuperação da doença. É preciso também investigar estratégias específicas para reduzir esse envelhecimento vascular precoce. Porque, embora já se saiba que hábitos saudáveis ajudam a preservar a elasticidade das artérias, ainda é necessário investigar protocolos direcionados para os efeitos da Covid-19 sobre o sistema vascular”, afirma.
O artigo Accelerated vascular ageing after COVID-19 infection: the Cartesian study pode ser lido aqui.
Fonte: Hoje em Dia