Municípios em crise pedem que BDMG não cobre dívida
A Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) voltou a discutir, na quarta-feira (27/3/19), a dívida do governo do Estado com os municípios mineiros.
Os prefeitos não aceitam a proposta do governador de começar a pagar os atrasados somente em fevereiro de 2020. A maior parte da dívida refere-se a parcelas do IPVA e do ICMS que são recolhidos pelo Estado e que, por lei, devem ser repassados aos municípios, mas que o governo tem retido, desde a gestão de Fernando Pimentel.
Para piorar a situação, mais de 250 municípios mineiros têm financiamentos com o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), cujas garantias de pagamento são os recursos do ICMS e também os recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Se a cidade não recebe o repasse do Estado, e não paga a dívida, o banco automaticamente retém o recurso do FPM daquela cidade.
O deputado Raul Belém (PSC), ex-prefeito de Araguari (Triângulo mineiro), foi quem solicitou a audiência, para ampliar a discussão e tentar ajudar a evitar o colapso total das finanças municipais. Mas o Executivo não mandou representantes para a reunião.
Diante dos apelos de deputados, de prefeitos e vereadores, para que o Estado se transformasse numa espécie de “fiador” dos municípios junto ao banco, a gerente de Direito Administrativo do BDMG, Ana Rosa Lemos da Cunha, disse que existe um impedimento legal para se fazer isso. Ela explicou que o artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal não permite ao banco público dar crédito para o seu ente mantenedor, que nesse caso é o próprio Estado.
Na prática, isso significa que o banco, que é público, não pode assumir a dívida do Estado com os municípios, colocando os repasses atrasados como garantia para as dívidas das prefeituras junto ao BDMG. “Qualquer solução para ajudarmos as prefeituras ainda tem que ser construída legalmente”, disse Ana Rosa Lemos da Cunha, ao explicar que a concessão de crédito aos municípios também é regulada pelas normas da Secretaria do Tesouro Nacional, que fixa prazo, taxas e formas de garantia dos empréstimos.
Deputados solicitam carência de dois anos para prefeituras
Diante do impasse, a Comissão de Assuntos Municipais aprovou requerimentos e vai encaminhar à direção do BDMG pedido para que seja editada norma ou instrumento jurídico que permita a suspensão, por dois anos, da dívida dos municípios com aquela instituição.
“Se as prefeituras não recebem do Estado, e estão sem dinheiro para os gastos básicos com saúde e educação, elas simplesmente não têm como pagar o banco”, disse o deputado. Os requerimentos, assinados por Raul Belém, Marquinho Lemos (PT), Fernando Pacheco (PHS), Antônio Carlos Arantes (PSDB) e pelas deputadas Rosângela Reis (Pode), Ione Pinheiro (DEM) e Celise Laviola (MDB) também solicitam ao BDMG que deixe de descontar automaticamente o dinheiro referente ao FPM nos contratos cuja garantia seja o recurso do ICMS (dinheiro não repassado pelo governo ao município).
Uma das propostas levantadas durante a audiência, pelo secretário municipal de Fazenda de Contagem, Gilberto Souza Ramos, que representou o prefeito Alex de Freitas, é para que a dívida do Estado com os municípios seja transformada em títulos públicos, que possam ser negociados no mercado financeiro e transformados em orçamento para as prefeituras. Ele explicou que a contabilidade pública é complexa, mas acredita ser possível que se faça essa operação.
Segundo Gilberto, a dívida do Estado com as prefeituras era de R$ 12,3 bilhões até 31 de dezembro de 2018. Em janeiro deste ano, o governador Romeu Zema teria repetido o erro de Fernando Pimentel e teria retido mais de R$ 1 bilhão que eram de direito dos municípios.
O vice-presidente da Assembleia, deputado Antônio Carlos Arantes, defendeu que o Estado encontre, urgentemente, instrumentos legais para quitar suas obrigações com as prefeituras. A presidente da comissão, deputada Rosângela Reis, a deputada Ione Pinheiro e o deputado Raul Belém voltaram a destacar a responsabilidade da ALMG de se posicionar firmemente com relação ao assunto.
Prefeitos sofrem desgaste e temem receber penalidades legais
Durante a audiência, prefeitos também voltaram a manifestar preocupação pelo fato de não estarem conseguindo cumprir suas obrigações, pela falta de dinheiro. O prefeito de Pirajuba (Triângulo), Rui Gomes Nogueira, afirmou que muitos já estão recebendo cartas do Tribunal de Contas do Estado, acusando-os de não terem cumprindo os índices constitucionais de investimentos em saúde e educação, por exemplo.
Segundo o prefeito, muitos municípios já conseguiram liminares na justiça, obrigando o Estado a pagar os recursos do ICMS e do IPVA que foram retidos. “Mas, quando a causa chega no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o presidente do órgão cassa as liminares”, reclamou Rui Gomes Nogueira. “Não podemos esperar mais. Se houver uma decisão política do governador de pagar as prefeituras, a questão legal se resolve”, disse.
O chefe do Executivo de Andradas (Sul de Minas), Rodrigo Lopes, também destacou o desgaste enorme que os prefeitos sofrem com a população, que cobra deles os serviços essenciais e o bom funcionamento da cidade.
Ao comentar os entraves legais citados pela representante do BDMG para ajudá-los, ele desabafou: “Também é ilegal reter o dinheiro das prefeituras. Pimentel fez isso, Zema também está fazendo, e nada aconteceu com eles ainda”.
O deputado Marquinho Lemos contou que a retenção do dinheiro do FPM está castigando ainda mais algumas prefeituras muito pobres do Alto Jequitinhonha, e quis saber se o banco não poderia criar uma força-tarefa para ajudar a encontrar uma solução.
ASCOM