Projeto de lei quer adotar quarto ano do ensino médio em Minas
A proposta, do deputado Dalmo Ribeiro (PSDB), prevê que o ano extra seria opcional, disponível a estudantes que cursam o terceiro ano do ensino médio em 2020 e se sentirem prejudicados devido às condições de aula impostas pela pandemia de coronavírus.
Sendo aprovado, o Projeto de Lei 2.046 de 2020 obrigaria realização de mudanças no Plano Estadual de Educação, que estabelece as diretrizes do ensino em Minas até 2027. O presidente do Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais (CEE/MG), Hélvio de Avelar, explica que alterações no plano precisariam ser avaliadas pelo conselho e diz não considerar a ideia de um quarto ano positiva neste momento. “É como se jogasse este ano fora e fizesse outro para compensar o que não foi feito neste. Todas as escolas, inclusive o sistema estadual, têm algum sistema de ensino remoto. Um quarto ano traria um impacto gigante, porque precisaria ser feito treinamento de professores e disponibilização de espaço físico ou seria algo sem muita qualidade ou sentido. Botar um ano por botar, sem saber o que o aluno vai fazer, o que e como vai ser recuperado e se existem professores o suficiente para isso é bem complicado”, diz.
Ele lembra, porém, que já existe a possibilidade de escolas oferecerem atividades optativas após o terceiro ano do ensino médio aos estudantes. Membro da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, o professor Chico Soares pontua que a reforma do ensino médio — que ainda não foi completamente adotada na prática — amplia ainda mais essas possibilidades. “Um quarto ano não é nada de outro mundo. Não podemos impedir o aluno de terminar o ensino médio neste ano, mesmo se for de forma precária, porque é direito dele. Mas, se a ideia é fazer nossa parte oferecendo mais a ele, sem tirar esse direito, me parece razoável”.
Ao mesmo tempo em que permitiria que alunos passassem mais tempo estudando, a opção do quarto ano poderia “atrasar” outros aspectos da vida dele, pondera Soares. A professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro do Observatório da Juventude, Shirlei Sales, concorda. Ela pontua que a formação no ensino médio é pré-requisito para muitos jovens brasileiros conseguirem empregos mais qualificados e também coloca em dúvida se todos seriam capazes de equilibrar mais um ano de estudo com necessidade urgente de renda.
“Seria ótimo que toda a juventude tivesse condições econômicas de se debruçar por mais um ano no ensino médio. Mas, infelizmente, essa não é a situação da nossa população brasileira. A estimativa é de empobrecimento dramático no país, o que vai levar a população de jovens a posições ainda mais precárias de trabalho, o que dificulta que equilibre esse trabalho com a escola”, diz.
Por outro lado, Sales reflete que oferecer a possibilidade de mais um ano no ensino médio seria uma forma de mitigar danos ao direito de aprender dos estudantes, que ela defende ter sido abalado durante a pandemia. “Mesmo os alunos da rede privada estão com o terceiro ano bastante comprometido, porque a educação a distância é algo completamente diferente do que tem sido desenvolvido até pela rede particular, que é quase um faz de conta. O que está sendo desenvolvido hoje é apenas transferência mecânica do que se fazia na sala de aula presencial para telas”, critica.
A estudante Fernanda Ferreira, 17, cursa o terceiro ano do ensino médio na rede estadual e, apesar de ver com bons olhos a possibilidade de um quarto ano para quem desejar, diz que não escolheria a opção. “Se tudo isso não tivesse acontecido, eu teria mais chances de passar no vestibular neste ano, mas estou me esforçando bastante para tentar ser o melhor que eu conseguir”, diz — o objetivo é passar no vestibular para Arquitetura na UFMG ainda em 2020. Já Breno Marques, 17, que completa o ensino médio na rede privada, cogita cursar o quarto ano, se ele for implementado: “Não me adaptei direito ao ensino remoto, porque foi uma mudança muito brusca. Talvez eu fizesse o quarto ano, mas não onde faço hoje, porque a mensalidade é cara”.
Em nota, a Secretaria de Estado de Educação (SEE-MG) afirma que, por respeito à autonomia entre os poderes, não comenta projetos de lei ainda em tramitação. “É importante destacar que, no retorno às atividades presenciais, a rede aplicará uma avaliação diagnóstica que servirá para traçar o plano de revisão de conteúdo individualizado para cada estudante. Assim, será possível traçar estratégias de reforço escolar, por exemplo”, finaliza.
Fonte: O Tempo