Médicos mineiros denunciaram 1,8 mil problemas na linha de frente da Covid-19
Problemas enfrentados na linha de frente do combate à pandemia do novo coronavírus levaram os médicos de Minas Gerais a formalizarem 225 denúncias no Conselho Federal de Medicina (CFM) durante o ano passado. A falta de equipamentos de proteção individual (EPIs) foi a queixa mais recorrente.
Segundo dados disponibilizados pela entidade e analisados por O TEMPO, os profissionais da categoria listaram ao todo 1.839 inconformidades na estrutura oferecida por unidades de saúde em 72 municípios de referência no Estado, sobretudo na rede pública. O balanço contempla o período entre abril e dezembro de 2020.
A maior dificuldade, mencionada em 38% dos relatos, foi a escassez de equipamentos de proteção. Consideradas obrigatórias no trato da Covid-19 pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), as máscaras do tipo N95 ou equivalente foram citadas em 155 ocasiões. Os profissionais também notificaram falhas no fornecimento de aventais, óculos ou escudos faciais, máscaras cirúrgicas e luvas, entre outros itens.
Já os materiais de higienização foram objeto de 23% das queixas. A ausência de álcool gel, por exemplo, foi denunciada 65 vezes, seguida de outros produtos básicos como sabonete líquido, papel toalha e desinfetante.
Na sequência (17%), aparecem reclamações referentes à falta de exames, medicamentos e insumos hospitalares, incluindo 105 relatos sobre a ausência de kits para a testagem de pacientes com suspeita de Covid-19. Também foram informadas limitações no acesso a diagnósticos por imagem (radiografia, tomografia, ressonância, etc.) ou a remédios e materiais para uso específico em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs).
A carência de recursos humanos motivou 8,3% das denúncias, com queixas relacionadas ao número insuficiente de médicos, equipes de enfermagem, fisioterapeutas e pessoal de limpeza ou cozinha. As demais notificações apontavam problemas no processo de triagem (falta de informações para os profissionais ou orientação aos pacientes e acompanhantes), além de dificuldades no acesso a leitos para internações.
Os formulários foram enviados por meio de uma plataforma online criada especificamente para as demandas relacionadas à Covid-19. Para registrar uma denúncia, o médico precisa informar CPF, número de inscrição no Conselho Regional de Medicina (CRM) e Estado no qual atua.
‘CONSEGUIMOS NOS SAIR MUITO BEM’
A presidente do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), Cibele Alves de Carvalho, afirma que os problemas de infraestrutura foram mais sentidos no início da crise, entre março e julho do ano passado, e não chegaram a comprometer o desempenho dos profissionais da saúde na linha de frente da pandemia.
“Foram questões contornáveis. O Conselho atuou, inclusive, extrapolando a própria competência, mobilizando e tentando ajudar para que em momento algum houvesse desassistência à população ou risco ao trabalhador da saúde. Em relação a denúncias, isso acabou. Desde outubro, novembro, já era algo bem pontual. Hoje, não chega mais nada”, diz.
De acordo com a médica, o total de denúncias feitas pela categoria em Minas passa de 300, quando somadas aquelas apresentadas à entidade regional. Ela reforça, no entanto, que o número de inconformidades relatadas já havia caído bastante desde o segundo semestre, graças a uma grande mobilização envolvendo vários setores.
“No início, houve a questão dos EPIs, especialmente da máscara N95. A resposta das unidades era que tinham o recurso financeiro, mas não encontravam para comprar, porque vinha da China. Depois, houve uma dificuldade com medicamentos para intubação. Pedimos ajuda, tivemos um trabalho magnífico do Ministério Público com os governos e diversas entidades, os hospitais privados ajudando… Enfim, tudo que era possível. Acho que conseguimos nos sair muito bem, graças a Deus”, avalia.
Questionada sobre os elevados números da pandemia em Minas desde dezembro, incluindo o novo recorde na média de mortes registrado no último fim de semana, a presidente do CRM garante que não há qualquer relação entre a alta nos óbitos e uma eventual carência de recursos na rede assistencial.
“As equipes de saúde estão exauridas, trabalhando no limite, mas estão trabalhando. Todo mundo está se mobilizando. E é por isso que nós fazemos um apelo pelas vacinas e pela conscientização. Precisamos sensibilizar a população, porque, se não mudarmos a cabeça das pessoas, não tem lockdown, nem medicamento, nem abertura de leito que vá resolver”, alerta a presidente do conselho.
MINAS OCUPA QUARTO LUGAR NO RANKING DE DENÚNCIAS
Segundo Estado do país em número de habitantes e em casos confirmados de Covid-19, Minas Gerais ocupa o quarto lugar no ranking de denúncias formalizadas ao CFM, atrás de São Paulo (545), Rio de Janeiro (266) e Bahia (231).
Do total de 1.839 inconformidades, 1.602 foram observadas no sistema público (87%). Os dados da entidade, porém, não detalham quantas se referem a unidades de gestão municipal, estadual ou federal.
Questionada, a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) informou que “não houve, em nenhum momento durante a pandemia, desabastecimento de equipamentos, insumos ou medicamentos” nas unidades da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig). A pasta destacou ter adquirido 8,5 milhões de pares de luvas, 6 milhões de máscaras, 5 milhões de toucas e 16 mil aventais para a rede estadual.
“Além disso, o governo adquiriu um estoque de kits para repassar a preço de custo para prefeituras e hospitais filantrópicos com dificuldades na aquisição de equipamentos de proteção. Esse projeto apoiou mais de cem municípios”, acrescenta a nota.
Sobre os recursos humanos, a SES informou que “vem remanejando internamente seus profissionais e abrindo constantemente processos seletivos para o preenchimento de vagas suprimidas em razão de afastamentos”.
Fonte: O Tempo