Câmara tem 450 projetos do século passado prontos para votação
A Câmara dos Deputados tem um número impressionante de projetos na fila para votação: são mais de 2.200. Ao levantar apenas do século passado, o Legislativo tem 453 propostas prontas para o debate e votação no plenário da Casa.
Entre propostas em trâmite, são mais de 34 mil no total. Destas, 1.501 são do século 20, de acordo com o sistema de proposituras da Câmara dos Deputados acessado na última semana.
Os mais antigos são da época em que o Brasil estava na Ditadura Militar. Em 25 de maio de 1983, o então senador Nelson Carneiro (RJ) apresentou proposta para garantir estabilidade temporária a um trabalhador que mover ação trabalhista durante tramitação da ação.
Baiano de Salvador, Carneiro morreu em 1996, em Niterói (RJ). O projeto de lei dele ficou pronto para ser votado no plenário da Câmara dos Deputados no ano seguinte, 1997. Desde então, 13 presidentes passaram pelo comando da Câmara sem pautar o projeto. Arthur Lira (PP-AL) é o 14º a comandar a Casa neste período.
A segunda proposta mais antiga é do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), preso recentemente por suposto envolvimento com milícias digitais. Em 1984, ainda na Ditadura Militar, Jefferson apresentou proposta para proibir a exposição de nomes e imagens de vítimas de “crimes contra os costumes”. Esta proposta está empacada desde junho de 1999.
O terceiro mais antigo, também de 1984, foi apresentado por Floriceno Paixão (PDT-RS), que institui regime de trabalho de seis horas para securitários (trabalhadores de companhias de seguros) e retirada da obrigação de trabalhar aos sábados. A proposta está pronta para ordem do dia desde 1995. O parlamentar morreu aos 91 anos, em 2011.
Vários motivos
O deputado federal Arlindo Chinaglia (PT-SP) foi consultado pelo O TEMPO para comentar sobre o assunto. Chinaglia presidiu a Câmara dos Deputados entre fevereiro de 2007 e fevereiro de 2009.
De acordo com o deputado, não existe uma causa apenas. Entre elas, “se não tem ninguém brigando pelo projeto, a tendência maior é cair no esquecimento”, avalia o deputado.
Sobre o projeto mais antigo pronto para votação na casa, de 1983, Chinaglia afirmou não ter conhecimento sobre a proposta. Isso porque o sistema da Câmara dos Deputados não aponta ao presidente em exercício esse tipo de informação.
“Por exemplo, como se decide a pauta? É ouvindo colégio de líderes. A última palavra é do presidente. Mas se o deputado não se movimenta, se o partido não se movimenta, aquilo não vai surgir no colégio de líderes”, explica o parlamentar.
Chinaglia relembra ainda que na época em que comandou a presidência da Câmara solicitou que presidentes de comissões apontassem propostas para colocar em votação. “Eu, inclusive mandei ofícios, fiz reuniões com os presidentes de comissões permanentes e falei: ‘olha, pegue os projetos que estão na comissão e selecione três para tentar pautar’. E nunca chegou nenhuma proposta”.
Falta de interesse na proposta
Outro ponto levantado por Chinaglia é o interesse interno e externo para que um projeto seja aprovado. “Não dá para taxar como única causa. Neste caso deste projeto (de 1983), a maioria ali (na Câmara dos Deputados) não é dos trabalhadores. Mesmo quando eu era líder ou do Lula ou da Dilma, eu nunca me iludi que nós teríamos base que fosse, digamos, favorável ao trabalhador e ferindo algum interesse do capital”, diz o deputado.
Trabalhar mais
O historiador Marco Antonio Villa avalia que o Poder Executivo atrapalha os trabalhos do Legislativo com o número alto de envio de Medidas Provisórias, que têm prazo mais rápido para tramitação, como consta no site do Congresso Nacional. Se não for apreciada em até 45 dias, a Medida Provisória entra em regime de urgência.
“A Medida Provisória acabou retirando do Congresso Nacional o papel de iniciativa legislativa. Muitas vezes o Executivo acaba determinando o ritmo de trabalho do Legislativo. Dessa forma as propostas do Legislativo ficam mais lentas. Esse é um problema que tem de ser enfrentado. É uma série histórica que precisa ser revista”, disse.
Villa também questiona o ritmo de trabalho dos deputados. As votações no plenário, por exemplo, ocorrem entre terças e quintas.
“Por outro lado, depende do próprio funcionamento interno da Câmara. Falta mais trabalho, ocupar mais a semana. Que seja uma semana com cinco dias úteis de trabalho. Isso também ajudaria. Teria mais tempo para apreciar os projetos, para discutir, para aprovação. Portanto, por um lado tem a presença excessiva do Executivo e do outro, falta trabalho”, afirmou o historiador.
Fonte: O Tempo