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MG tem uma denúncia a cada 4 minutos por violência doméstica contra a mulher

Redação13 de novembro de 202313min0
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Caso Ana Hickmann expõe que a escalada de violência atinge todas as classes sociais e raças, aponta especialista

A cada quatro minutos, uma mulher denuncia ser vítima de violência doméstica em Minas Gerais. Entre janeiro e setembro de 2023, o número de queixas contra agressores no Estado registrou uma alta de 6%, quando comparado ao mesmo período do ano passado, conforme dados da Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). Especialista aponta que, apesar de as mulheres negras e periféricas serem as que mais denunciam, a escalada de violência atinge todas as classes sociais e raças. O tema vem à tona após a apresentadora Ana Hickmann denunciar o marido, Alexandre Correa, por agressão no último sábado (11 de novembro).

Hickmann procurou a delegacia após uma briga com o marido. No boletim de ocorrência, consta que o empresário teria ameaçado dar cabeçadas na esposa. Ela precisou imobilizar o braço com uma tipóia após uma contusão no cotovelo em decorrência de uma porta de correr que Alexandre fechou com força e acabou atingindo a esposa. Apesar da denúncia, a artista preferiu não solicitar medida protetiva da Lei Maria da Penha.

Caso semelhantes ao da apresentadora se repetem diariamente em Minas. Entre janeiro e setembro de 2023, mais de 110,5 mil mulheres foram vítimas de violência doméstica, em comparação com os cerca de 104 mil casos anotados no mesmo período de 2022. Em todo o ano passado, foram feitas em torno de 141 mil denúncias por esse tipo de violência.

A jovem técnica em veterinária Jéssica Milanêz, de 24, faz parte dessa estatística. Ela ficou por um triz de perder a vida ao viver um relacionamento abusivo que a fez ser internada em estado grave em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, com diversos hematomas pelo corpo. Jéssica e o agressor, de 26, passaram pouco mais de 8 meses juntos, o suficiente para a violência saltar de repreensões verbais para cárcere privado. “No início, ele era maravilhoso, me presenteava, me mimava. Mas, aos poucos, começaram as agressões. Ele me culpava por tudo, e as agressões verbais passaram para físicas. Ele quebrava coisas em mim e não me deixava mais sair de casa, para que ninguém visse os machucados e, então, não pudesse denunciar”, lembra Jéssica.

Rotina de agressões

A jovem ficou cinco meses presa dentro de casa, quando as agressões eram rotina. Para fugir da realidade, e ainda dependente emocional do agressor, Jéssica abusava dos medicamentos – em um dos episódios, tentando dar fim à própria vida. “Achei que só assim ele me deixaria em paz”, lamenta. A jovem perdeu o bebê que esperava do agressor durante um espancamento. E, da última vez, quando precisou ser internada devido aos machucados, entendeu que seria um basta.

“Vi o médico pedir para minha mãe rezar por mim. Naquele momento, eu ainda queria voltar para casa, voltar para ele. Fiquei três meses fora da cidade, porque tinha tanto trauma que não conseguia andar na rua. Medo de ser vigiada, medo de tudo. Só agora, dez meses depois, e com ajuda de terapia, estou melhorando. Quero que sirva de inspiração para outras mulheres. A agressão não faz mais parte da minha vida, nem verbal, nem física, nem emocional”, diz Jéssica.

Com Cecília da Conceição Gomes, de 46 anos, a compreensão da violência também aconteceu após os traumas. A educadora foi resgatada pela vizinha quando já estava no sexto mês de cárcere privado dentro da própria casa no bairro Concórdia, na região Nordeste de BH. Foi em um abrigo para mulheres vítimas de violência que ela começou a entender que tinha passado por um abuso e que nada tinha sido sua culpa. “Eu sobrevivi. Você sabe o que é um homem enfiar uma chave de fenda em você para tentar tirar o seu DIU? Sabe o que é ter seus dentes quebrados para que não possa sorrir para outras pessoas? Eu fiquei seis meses sem ver a luz do sol, poderia ter morrido”, lamenta.

Anos após a separação, o caso de Ana Hickmann fez Cecília reviver o passado. “É a prova de que a violência doméstica acontece em todas as classes. Não foi só comigo, que sou pobre, que não tinha conhecimento e nem sabia da lei Maria da Penha. Quando eu vi um vídeo da Ana com o marido, eu reconheci na hora os sinais de um homem agressor, assim como foi comigo”, lamenta. Hoje, Cecília estuda para ser assistente social e trabalha ajudando mulheres vítimas de violência. “Nós mulheres podemos ser independentes, merecemos um relacionamento sem agressão. É por isso que, tendo sido vítima e agora estudando sobre, quero ajudar àquelas que precisam”, diz.

Violência não escolhe classe

A especialista em Segurança Pública, Ludmila Ribeiro, aponta que o caso envolvendo Ana Hickmann expõe o retrato da violência doméstica, que não escolhe classes sociais. “A gente vê que a maioria dos casos ocorrem com mulheres de menor escolaridade e negras, mas elas não são o total. Na verdade, elas são as que mais registram, já que as mulheres mais ricas acabam recorrendo a advogados e mediadores familiares, por exemplo. Muitas vezes as vítimas de maior poder econômico têm ausência de confiança na capacidade da Justiça e dos órgãos de segurança em dar resposta adequada e por isso recorrem a outros instrumentos”, explica.

Apesar do crescimento dos registros em Minas, a especialista aponta uma subnotificação dos casos, com apenas 10% deles chegando ao conhecimento da polícia. Do total de ocorrências, apenas metade são de violências ocorridas pela primeira vez, enquanto as demais são de casos de maior frequência, sendo que 15% são de atos reiterados – com mais de três episódios. Por isso, na avaliação de Ludmilla, a denúncia oferecida pela apresentadora é essencial para conscientizar mulheres sobre a importância de denunciar todas as formas de violência desde o primeiro episódio. “Temos uma pesquisa anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública que analisa o crescimento da violência, mas em uma estimativa nacional. Os dados mostram uma maior conscientização das mulheres sobre a necessidade de denunciar casos que não geraram uma lesão permanente, além de registros de ameaças que não deixam tantas marcas. O caso (Hickmann) é importante porque ajuda na conscientização das mulheres em denunciar”, aponta.

Para a especialista, a solução para a violência doméstica está ligada à educação e ao fim da naturalização do homem como ser de “força”. “É preciso investir em prevenção, isso significa repensar todo o modelo nas escolas, em filmes e livros estudados. Tudo isso para combater a naturalização do ‘bater em mulher’. A fala do marido de Ana mostra essa naturalização. Ele disse que foi um ‘episódio isolado’, como se estivesse tudo bem agredir em um caso isolado. Enquanto ensinarmos que homens são fortes e viris e que, por isso, às vezes precisam recorrer a violência, vamos repetir esse cenário. Por isso, denunciar é importante para termos um dado e uma forma de analisar para combater”, finaliza.

Governo garante auxílio às vítimas

Em nota, o Governo de Minas Gerais afirmou que tem desenvolvido e estimulado políticas de combate à violência contra a mulher, em busca de prestar auxílio necessário às vítimas, atuar na prevenção de casos enquadrados na Lei Maria da Penha e, sobretudo, combater as ocorrências de feminicídio.  Para isso, estão em pleno funcionamento 69 Delegacias de Atendimento à Mulher, tanto no interior quanto na capital, para atendimento às mulheres vítimas de violência, incluindo casos de importunação ofensiva e violência doméstica e sexual.

Além disso, o Governo de Minas também gerencia o Centro Risoleta Neves de Atendimento (CERNA), que realiza atendimento psico-jurídico-social às mulheres mineiras da capital e do interior, além de oferecer capacitações a outros equipamentos da rede de enfrentamento à violência contra mulheres, incluindo discussão de casos e orientações técnicas para o devido atendimento psicossocial. O Estado conta ainda com o programa MG Mulher que foi desenvolvido pela Polícia Civil, com apoio da Sejusp, para dar suporte às vítimas, monitorar agressores e estudar e discutir o fenômeno criminal da violência contra a mulher.

Para além do trabalho de prevenção e enfrentamento realizado com as mulheres, a Sejusp também atua com homens agressores. Por meio do programa Central de Acompanhamento de Alternativas Penais (Ceapa), homens processados e julgados por crimes relacionados à Lei Maria da Penha são encaminhados pela Justiça para participar de grupos reflexivos de responsabilização sobre os atos cometidos. Durante os encontros, várias temáticas são discutidas e experiências trocadas, a fim de que os participantes se reconheçam como autores responsáveis pela violência praticada e possam, assim, modificar seu comportamento.

Como denunciar violência doméstica?

  • Denúncias podem ser feitas por meio da Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência (disque 180) ou do Disque-Denúncia Unificado (disque 181).
  • O registro da ocorrência pode ser feito na delegacia policial mais próxima ou em Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs). Em Belo Horizonte, há uma unidade na Avenida Barbacena, 288, Barro Preto.
  • Pela Delegacia Virtual, podem ser registrados casos de ameaça, lesão corporal e vias de fato, além de descumprimento de medida protetiva. Por meio da plataforma digital, as vítimas ainda podem solicitar a medida protetiva enquanto estiverem fazendo o registro.

Por Raíssa Oliveira e Isabela Abalen

Fonte: O Tempo

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