Alta de doenças respiratórias e postos mais cheios: veja efeitos dos incêndios na saúde pública
As queimadas que assolam o país também pressionam o sistema de saúde, provocando temores quanto aos impactos sanitários. Na última segunda-feira (9/9), a ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou que apesar de não faltarem leitos, a situação acende um alerta. “Há um impacto forte no sistema de saúde, nas unidades de atendimento, uma maior procura e, principalmente, uma preocupação não só com os efeitos de curto prazo, mas também de médio prazo na saúde das pessoas”.
Conforme a ministra, as nuvens de fumaça que tomam conta de várias cidades afetam a qualidade do ar e agravam ainda mais as condições de saúde neste período, que já tende a ter alta de casos de síndrome respiratória aguda grave. “A grande preocupação é com os idosos e as crianças, em função dos problemas respiratórios. Também há outros grupos de pessoas que sofrem mais, principalmente quem tem quadros de problemas alérgicos. É um motivo de grande atenção”, afirmou Nísia.
Algumas cidades já começam a ter que lidar com os reflexos na saúde. São Paulo, por exemplo, registrou 76 mortes por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) de agosto até a primeira semana de setembro. Foram 1.523 casos, segundo a Secretaria Municipal da Saúde. Ainda não há oficialmente correlação, mas neste período o Estado foi atingido por incêndios florestais que devastaram várias regiões.
O boletim InfoGripe da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), divulgado no dia 12 de setembro, mostrou que há um sinal de aumento de SRAG na tendência de longo prazo (últimas seis semanas) e de curto prazo (últimas três semanas) no país. Conforme o levantamento, 15 Estados apresentam indícios de crescimento da síndrome a longo prazo. Entre as capitais, 15 tiveram alta de ocorrências de SRAG: Brasília (DF), Campo Grande (MS), Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Fortaleza (CE), Goiânia (GO), João Pessoa (PB), Macapá (AP), Palmas (TO), Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Teresina (PI) e Vitória (ES).
Aumento da dengue
As frequentes ondas de calor provocadas pelas mudanças climáticas, somadas à urbanização incompleta e ao intenso fluxo de pessoas em certas regiões, estão contribuindo para a expansão da dengue para o interior do Brasil. Essa é a conclusão de um estudo intitulado “Mudanças climáticas, anomalias térmicas e a recente progressão da dengue no Brasil”, publicado em março deste ano no portal Scientific Reports, da Nature.
No estudo, o pesquisador Christovam Barcellos, do Observatório de Clima e Saúde, ligado ao Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), destaca que a dengue está avançando para as regiões Sul e Centro-Oeste, onde anteriormente a doença era menos comum. Esse avanço está relacionado ao aumento de eventos climáticos extremos, como secas e enchentes. Outro fator importante é a degradação ambiental, especialmente no Cerrado, que tem sido impactado por desmatamento, queimadas e a transformação de florestas em pastagens.
Os reflexos no corpo
Na capital mineira, não chove há 150 dias. Além disso, a cidade está tomada por névoa, provocada pela fumaça das queimadas, poluição e poeira. Outro fator agravante é a umidade relativa do ar mínima, que tem ficado em níveis baixíssimos, contribuindo para o “clima de deserto”. “O tempo seco associado à fuligem das queimadas impactam a saúde das pessoas, especialmente para aquelas que têm problemas respiratórios, como asma, bronquite ou outras condições pulmonares. O problema da inalação de fuligens é que as partículas podem irritar o sistema respiratório e agravar os problemas existentes,” afirma a pneumologista do Mater Dei Layla Fayne.
Outra condição agravada pelos efeitos das queimadas é a saúde ocular. A combinação de poluentes, incluindo partículas finas, gases tóxicos e compostos químicos, pode irritar os olhos e causar diversos problemas à superfície ocular. “Nesse período do ano, já temos a baixa umidade do ar que causa o olho seco. Com a intensidade das queimadas, a fumaça e as pequenas partículas que elas deixam no ar, podem piorar ainda mais os sintomas do olho seco e causar irritação ocular”, explica a oftalmologista do Hospital Felício Rocho Marina Carvalho.
Conforme a médica, nos olhos, os sinais mais comuns dos efeitos dos incêndios incluem vermelhidão, prurido (coceira), ardência e edema (inchaço) conjuntival e palpebral. “Nesse período, é indicada a hidratação oral, o uso de colírios lubrificantes – quando recomendados – e evitar coçar os olhos. Se tiver contato ocular com fuligem, lavar os olhos com soro fisiológico em abundância e procurar o seu oftalmologista imediatamente”, alerta a especialista.
Impactos físicos e mentais
Um estudo da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com outros centros de pesquisa, mostrou que os poluentes de incêndios florestais – especialmente na Amazônia – geram impactos físicos e mentais. Os dados – coletados por satélite entre 2010 a 2019 – alertam para o potencial carcinogênico de algumas partículas poluidoras resultantes das queimadas.
“O poluente que é tratado no estudo a gente chama de material particulado 2.5. O 2.5 se refere ao tamanho dessa partícula, que é muito pequenininha, capaz de entrar nos nossos pulmões e atravessar barreiras de proteção, cair na corrente sanguínea e fazer bastante mal para saúde. Essas partículas são muito ricas em hidrocarbonetos policíclicos aromáticos. Entre esses compostos, alguns são carcinógenos já conhecidos. Outro estudo do nosso laboratório avaliou o potencial carcinogênico dessas partículas e descobriu que elas podem induzir mutações nas células, que eventualmente podem levar ao câncer”, explicou a bióloga e chefe do Laboratório de Patologia Ambiental e Experimental (LIM05) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, Mariana Matera Veras, ao jornal da universidade.
Fonte: O Tempo