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Vencedora do prêmio Culturas Populares relembra trajetória: ‘Só por ser negro, já é discriminado’

Julia Toledo21 de novembro de 20186min0
lucia
Lucia Vera Lima é presidente do Centro Cultural Afro Brasileiro Chico Rei, de Poços de Caldas (MG), e ativista pelos direitos dos negros há mais de 20 anos.

“Só por ser negro, já é discriminado”. A frase é de Lucia Vera Lima, ativista do movimento negro e diretora do Centro Cultural Afro Brasileiro Chico Rei, de Poços de Caldas (MG). Lucia relembra, neste Dia da Consciência Negra, a trajetória pela qual passou até chegar à instituição e ser reconhecida com o prêmio Culturas Populares, do Ministério da Cultura, no fim de outubro passado.

Mesmo nascida em família pobre, Lucia e o irmão estudaram em colégios particulares na cidade. Logo cedo, ela começou a fazer teatro e, depois, partiu para o balé, quando teve a oportunidade de conhecer Chico Rei pela primeira vez – centro ainda hoje formado somente por negros e que foi fundado em 1963 com intenção de reunir e fortalecer a comunidade.

“Eu botei o pé na porta do Chico Rei e foi amor à primeira vista, à primeira pisada. Nunca mais saí de lá”, diz.
Foi somente ao passar a integrar o movimento negro que Lucia teve compreensão de como o racismo se manifestava de diversas maneiras. Foi também ali, no contato com outras histórias e pessoas, que entendeu que já sofrera preconceito em algumas ocasiões.

“Se até então você me perguntasse ‘em qual momento da sua infância ou adolescência você sofreu racismo?’, eu não saberia te contar. Hoje, quando eu me lembro penso: ‘Já sofri preconceito sem saber'”, afirma.

Lucia se lembra de ter se sentido diferente em várias situações por ser a única menina negra na escola, no balé e no teatro. Recorda-se, inclusive, de comentários que acreditava serem elogios, mas que hoje sabe se tratar de racismo.

“‘Ela é pretinha, mas é tão bonitinha’. Essa frase por si só já tem uma construção racista, mas eu ouvia e achava que estava sendo elogiada”, reflete a diretora.
Da infância até os dias atuais, afirma que o racismo não deixou de mostrar sua cara. Além disso, a Lucia acredita que as manifestações racistas só se intensificaram com o passar do tempo.

“Nós não conseguimos desconstruir esse racismo desde a época da abolição, ainda estamos nesse processo. Antigamente se falava muito pouco, a gente não tinha muito esse entendimento do que era racismo, era mais velado. Hoje está muito mais aberto, as pessoas sentem isso na alma e na pele. Muitas vezes, as feridas ficam aí abertas para o resto da vida. Costumo dizer que para o resto da vida, mais dois dias”, ressalta.

Lições que ficam
O legado de Lucia está sendo passado para sua neta, Lavínia. Com apenas 6 anos, a menina chama atenção pela confiança. Exibe com orgulho os cachos e tem orgulho da pele negra. Nos eventos organizados pelo Chico Rei, está sempre ao lado da avó, que reforça que esse empoderamento é uma tarefa diária.

“Já aconteceu dela chegar e dizer ‘queria que meu cabelo fosse liso igual o da minha amiguinha’. Aí a gente está sempre lembrando ‘seu cabelo é muito bonito, sua pele é muito bonita’. Porque, apesar dela ter a pele mais clara, ela é negra, e tem que se reconhecer como negra”, conta.

A relação entre as duas também levou Lucia a conhecer outra parte de sua própria história. Há cerca de três anos, procurava uma boneca para fazer junto com a criança, quando descobriu sobre as bonecas Abayomi, criadas por mães africanas como amuleto de proteção para os filhos durante viagens a bordo dos tumbeiros. O nome ‘Abayomi’ remete à ‘Encontro Precioso’ em Iorubá, uma das maiores etnias do continente africano.

“Foi meio que aquela coisa do amor, porque está no sangue, está na pele da gente enquanto negro. A boneca Abayomi é uma coisa que me representa muito”, afirma.

Ativismo 365 dias por ano
“Não adianta a gente falar sobre racismo e preconceito só em novembro. Aí chega fevereiro, março, não lembra mais. Não é isso que a gente quer, a gente quer que essa discussão seja ampliada durante o ano todo”.

O pensamento de Lucia vai ao encontro do trabalho desenvolvido no cotidiano no próprio centro e entre os membros da comunidade. A luta diária passa pelo estudo da história negra e também pela construção de uma visão não vitimista, onde cada um tem o seu lugar.

“A partir do momento que essas falas vão sendo moldadas sem serem estereotipadas, esse 20 de novembro já começa a tomar outra forma, e não só de comemoração. É uma data de reflexão, de saber o que nós negros temos de bom. Precisamos saber ocupar nossos espaços, que historicamente nos são negados”, conclui.

 

Fonte: G1.com.br

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